Violência e assédio online no jornalismo

É hoje habitual que jornalistas tenham formação em segurança e defesa que os/as prepara para cenários conturbados. Num momento em que os números de assassinatos e de ataques à integridade física de jornalistas se mostram cada vez mais preocupantes um pouco por todo o mundo, estas formações são, efetivamente, essenciais. No entanto, muitos dos ataques a jornalistas não ocorrem em contexto de guerra. A violência sobre elas/eles exercida tem igualmente assumido uma forma menos imediatamente visível, mas não menos preocupante: aquela que se desenvolve no ambiente digital.

Se é certo que a hostilidade para com jornalistas sempre existiu, os espaços digitais estão atualmente saturados de novas formas de ataque ao jornalismo, muitas vezes vindas de atores organizados, mas também de pessoas individuais. A popularização do termo «jornalixo» nas redes e caixas de comentários a notícias é um exemplo dessa hostilidade, mas esta pode assumir formas mais violentas.

Na verdade, os/as jornalistas estão hoje muito visíveis e acessíveis. As redes sociais e o jornalismo digital facilitaram essa visibilidade e aumentaram a proximidade entre profissionais e audiências. Se tal facilita conversas e fomenta oportunidades democráticas de debate e crítica do jornalismo, a possibilidade de o público comentar ou aceder facilmente aos/às jornalistas também se tornou uma armadilha.

Nem todos os públicos se envolvem em comentários destrutivos, mas os insultos reiterados, as ameaças ou o assédio não podem ser confundidos com crítica. Na verdade, um crescente corpo de investigação — que inclui o estudo desenvolvido pelo projeto que dá origem a este Guia — mostra que existem tentativas de  interferência  no trabalho diário dos/as jornalistas sob a forma de ameaças implícitas e explícitas online. As consequências deste ambiente perturbador estendem-se à vida pública, já que tais ataques no ambiente digital podem não só vir a propiciar futuros ataques físicos, como serem inibidores da realização do trabalho jornalístico em plena liberdade. Como acontece com a violência física em campo, a retórica violenta digital cria um clima de intimidação que pode levar à autocensura e ser altamente perturbadora da saúde mental a que todos e todas as jornalistas têm direito, no exercício da sua profissão.

Foi com estas preocupações em mente que o Guia que aqui se apresenta foi desenvolvido no âmbito do projeto «O género nas pandemias de ódio: media sociais, Covid 19 e as mulheres jornalistas» [ID 75893685], financiado pela FCT e desenvolvido no Instituto de Comunicação da Nova (ICNova), na Universidade Nova de Lisboa, nos anos de 2021 e 2022. As propostas de prevenção e boas práticas aqui desenvolvidas baseiam-se largamente em outras fontes e guias semelhantes publicados internacionalmente e constituem pistas para formas de prevenção do que deliberadamente chamamos «violência online», já que as consequências dos ataques para os/as jornalistas são reais — não são virtuais. Tais propostas têm também por base as experiências recolhidas nos testemunhos de mulheres jornalistas dados em entrevistas à equipa de investigação do projeto, bem como a partir de um inquérito elaborado pelo mesmo projeto e distribuído com apoio da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ).

O Guia está subdividido em quatro partes — empresas  noticiosas, outras entidades e associações, jornalistas e freelancers. De notar que consideramos que é, antes de mais, às empresas jornalísticas  e  a outras entidades e associações que cabe o primeiro papel na prevenção e nas boas práticas. As organizações jornalísticas têm um  dever urgente de apoiar as suas e os seus profissionais porque o problema não se coloca ao nível individual. Preventivamente, uma das primeiras medidas a tomar por parte das organizações noticiosas e outras entidades é combater a normalização e aumentar a consciencialização de que o problema é real e que deve de ser denunciado.

Abordar a questão da violência online na sua forma de política institucional e tornar o mais simples possível a editores/as  e gestores/as implementar medidas de prevenção envia para a sociedade um sinal de que não é aceitável que jornalistas — especialmente mulheres e jornalistas pertencentes a diferentes grupos minoritários — tenham de viver com esse tipo de abuso todos os dias e que os órgãos de comunicação social reconhecem que esta não é uma forma aceitável de exercer a sua profissão. Além disso, tal como  se  preparam jornalistas para questões de segurança física, é fundamental formar essas pessoas em segurança e defesa online.

As recomendações que apresentamos abordam, pois, práticas de prevenção e atuação no caso de os ataques acontecerem. Na última seção, é possível consultar outras fontes e guias que, escritos por especialistas em segurança, privacidade digital e violência baseada no género, basearam em larga medida as boas práticas que aqui reunimos.

Guia de prevenção e boas práticas

Pode fazer  aqui o download.

Fontes

Os estudos e guias sobre a violência e o assédio online a jornalistas são crescentes. Sugerimos que comece pelos recursos da TrollBusters, do Committee to Protect Journalists e do the DART Center for Journalism and Trauma.

Outros recursos são: